Os desafios que os educadores têm tido nas várias práticas de escolarização popular não são pequenos. Dificuldades em ensinar, em lidar com a motivação, em conseguir ganhos de consciência são permanentes nos relatos de professores que trabalham na alfabetização de jovens e adultos das camadas populares.
Os jovens e adultos que voltam à escola relatam que buscam o domínio da leitura e da escrita para melhorar de vida e saber mais. A melhora de vida está em desde deixar de trabalhar como empregada doméstica até poder ajudar os filhos em suas tarefas escolares. Os relatos não são simplificados, há toda uma gama de motivações, às vezes difíceis de serem expressas e outras vezes não expressas em um primeiro momento. Cabe ao professor perceber suas expectativas e como a escola se insere na vida desses adultos.
O primeiro desafio ao chegar na escola é enfrentar uma situação desconhecida, povoada pelas lembranças vividas na escola e pela expectativa do novo. As experiências escolares anteriores, em sua grande maioria, são desestimulantes e cheias de histórias de fracasso. Não é pequeno o número daqueles que se consideram de "cabeça dura" e que "não dão pró estudo", a partir da incorporação do fracasso. Justificam o abandono à escola a necessidade de trabalhar, distância da escola, ausência de escola no local ou ausência de professores. Afirmam também que a desconsideração dos pais pela educação contribuiu para o abandono da escola.
Os movimentos sociais organizados ou a instituições que têm trabalho popular, procuram fazer da prática educativa de alfabetização também um desafio de ordem política, pois ao mesmo tempo que trabalham com os códigos da aprendizagem da leitura e da escrita, procuram o desafio de ampliar os ganhos de consciência dos grupos populares ao refletir sobre a sua realidade e sobre o seu mundo.
O professor precisa estar seguro e motivado para ajudar a vencer as dificuldades e medos de seus alunos no retorno à escola. Para isso a concepção freireana de homem e de mundo, remete, em sua essência, a uma postura pedagógica:
Assim, a vocação do homem é a de ser sujeito e não objeto ( ...) não existem senão homens concretos ('não existe homem no vazio'). Cada homem está situado no espaço e no tempo, no sentido em que vive numa época precisa, num lugar preciso, num contexto social e cultural preciso. O homem é um ser de raízes espaço-temporais.2
(...) Para o homem, o mundo é uma realidade objetiva, independente dele, possível de ser conhecida.3
A partir das relações do homem com a realidade, resultantes de estar com ela e de estar nela, pelos atos de criação, recriação e decisão, vai ele dinamizando o seu mundo. Vai dominando a realidade. Vai humanizando-a. Vai acrescentando a ela algo de que ele mesmo é o fazedor. Vai temporalizando os espaços geográficos. Faz cultura. E é ainda o jogo dessas relações do homem com o mundo e do homem com os homens, desafiado e respondendo ao desafio, alterando, criando, que não permite a imobilidade, a não ser em termos de relativa preponderância, nem das sociedades e nem das culturas. E, na medida em que cria, recria e decide, vão se conformando as épocas históricas. É também criando, recriando e decidindo que o homem deve participar destas épocas.4
São extratos de algumas obras de Paulo Freire apontam para a profundidade de seus pensamentos. Ao conceber o homem como ser de vocação ontológica para ser sujeito, como um ser de relações atuando na realidade, já se antecipa que, para Paulo Freire, o processo de aprendizagem é dinâmico e ativo. Quando aceitamos que o homem seja sujeito na compreensão do mundo, aceitamos que também o seja na construção do seu conhecimento sobre a escrita, uma parcela do conhecimento social.
BIBLIOGRAFIA
HARA, Regina. Alfabetização de adultos: ainda um desafio. 3. ed. São Paulo: CEDI, 1992
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Um comentário:
Olá Ivone:
São substanciais as informações, os conhecimentos que trazes relativos à Educação de Jovens e Adultos.
Tens alguma prática tua ou do teu entorno de EJA que gostarias de compartilhar conosco, que pudesse servir de evidência para o que trazes?
Abraço.
Celi
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